«O Regresso das Bandeiras» <br>vermelhas
No âmbito das comemorações dos 80 anos da Jornada de Agitação e Luta de Fevereiro de 1935, realizadas no Barreiro, no domingo, 28, foi inaugurada, no Espaço Memória, a exposição «O Regresso das Bandeiras».
Celebrar um momento maior da luta contra o regime fascista
Na madrugada do dia 28 de Fevereiro de 1935, vários homens colam nas vilas do Barreiro e Lavradio manifestos e tarjetas «Contra a guerra imperialista», «Contra a ditadura de Salazar», pelo apoio ao «Socorro Vermelho Internacional», pela «Jornada de 7 horas sem redução de salários», entre outras reivindicações.
Na mesma noite, são hasteadas bandeiras vermelhas em algumas das principais ruas do Barreiro e do Lavradio. Mas a maior surpresa surge na chaminé das Oficinas Gerais da CP. No topo dos seus 36 metros, ondula ao vento uma bandeira na qual alguém pintou uma foice e um martelo e as iniciais PCP.
Nos dias seguintes, a polícia política (PVDE) prende 35 cidadãos, que, depois de interrogados e acusados de participação no «Processo das Bandeiras», passaram vários anos, alguns uma década, nas prisões do fascismo: Aljube, Caxias, Peniche, no Tarrafal. No entanto, a resistência e a luta não abrandaram.
A documentação do «Processo das Bandeiras» (da PVDE), bem como as bandeiras hasteadas em 1935, acabaram no Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Em Dezembro de 2015, no âmbito de uma parceria entre este e a Câmara do Barreiro,
ocorreu a entrega simbólica dos documentos, em suporte digital, ao município, que assim passou a dispor do acervo que assinala um momento icónico da história do Barreiro do século XX, da resistência ao fascismo e da luta pela liberdade e pela paz.
Luta contra o fascismo
Na inauguração da exposição «O Regresso das Bandeiras» estiveram cerca de duas centenas de pessoas, que começaram por ouvir as intervenções de Carlos Humberto de Carvalho, presidente da Câmara do Barreiro, e de Silvestre Lacerda, director-geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas. Destaque ainda para a presença, entre outros, de Joaquim José da Costa, filho de Acácio José da Costa, um dos envolvidos no «Processo das Bandeiras», e de uma delegação do PCP – constituída por Francisco Lopes, José Capucho, do Secretariado do Comité Central, e Margarida Botelho, da Comissão Política e responsável pela Organização Regional de Setúbal. Presentes estiveram ainda os deputados comunista Paula Santos e Bruno Dias, assim como Domingos Abrantes, destacado militante do Partido e representante da Assembleia da República no Conselho de Estado.
Antes, teve lugar uma actuação de Valu, Fernando Matias e Alberto Cruz, com o tema «Tarrafal». Ao mesmo tempo foram enumerados os nomes dos presos/mortos nesta prisão do fascismo.
Carlos Humberto começou por valorizar o papel activo do Espaço Memória na valorização da história e património do concelho. «Estamos a dar corpo e conteúdo à vocação do Espaço Memória, promovendo uma abordagem participada, colaborativa, multidisciplinar e cidadã dos processos históricos e sociais que marcaram o território desde o início da sua humanização», afirmou, salientando que, desta forma, «estamos a estreitar laços com a população, com o movimento associativo, com a comunidade educativa e com instituições congéneres».
«O Regresso das Bandeiras» assume, por isso, uma «enorme importância ao celebrar um momento maior da luta contra o regime fascista, onde, como noutros tempos, o contributo dos barreirenses marcou presença, com todas as consequências que daí advieram para os intervenientes e para a comunidade», destacou o presidente da autarquia, ressalvando que a mostra vem «contribuir para o conhecimento e aprofundamento da reflexão em torno de um facto histórico que extravasa manifestamente as fronteiras do Barreiro, constituindo património comum dos portugueses e, particularmente, de todos os que hoje continuam a inscrever as suas opções de vida na defesa da democracia, no desenvolvimento do País e na emancipação dos portugueses».
Carlos Humberto afirmou ainda que «é preciso persistência e convicções profundas e uma grande firmeza na luta contra os que querem pôr em causa a democracia e a liberdade, as mesmas dos que em 1935 tiveram a ousadia de construir a liberdade».
Por seu lado, Silvestre Lacerda chamou a atenção para a «Jornada de Agitação e Propaganda contra a Fome, a Guerra e o Fascismo», que se celebrou entre 24 de Fevereiro e 2 de Março de 1935, e «foi convocada pela Comissão Intersindical, pela Federação das Juventudes Comunistas e pelo PCP», após um ano da data de 18 de Janeiro de 1934. A luta do proletariado português, apesar da brutal repressão, não desapareceu. Os trabalhadores foram capazes de se recompor e desenvolver acções de propaganda com mensagens «Abaixo a ditadura salazarista», entre outras, e de reivindicação das sete horas de trabalho sem redução de salários.
A exposição
Na exposição – que pode ser visitada, nos próximos seis meses, de terça-feira a sábado, das 10 às 13 horas e das 14 às 18 horas – são explanadas as seguintes abordagens: «O mapa das bandeiras», com destaque para as duas bandeiras vermelhas originais; os vários documentos do «Processo das Bandeiras»; o contexto internacional – «Ascensão do nazi-fascismo»; o contexto nacional – «Da ditadura militar ao Estado Novo»; «Barreiro anos 30/40 – Condições de vida e sobrevivência quotidiana»; «Resistir, organizar e lutar – a organização comunista local» (a greve de braços caídos), os percursos penitenciários – as prisões «Olho de Boi», «Caxias», «Aljube», Peniche, Tarrafal; Angra; um poema de Ary dos Santos, que evoca «o 25 de Abril». No final o visitante pode escrever a sua opinião num último painel.